Hoje o dia amanheceu de
uma calmaria desconcertante. Abri a porta que dá para o quintal e me deparei
com uma cena lindíssima! Fazendo a maior algazarra sobre a grama, um passarinho
do papo amarelo, lindo e faqueiro tomava seu banho matinal na água que escorria
do regador. Era um bem-te-vi festeiro.
Fiquei olhando aquela
cena e me perdi em pensamentos.
Lembrei-me da história
que minha mãe nos contava sobre como o João de Barro foi criado por Jesus. Ela
nos contava que uma criança havia feito um passarinho de barro, e olhando sua
obra acabada e tentando dar vida a ela, começou a rodopiar em volta do pássaro
e batendo palmas dizia:
Voa passarinho! Voa
passarinho! – E que Jesus vendo de longe a pureza do menino, o ajudou na sua
façanha, dando vida ao passarinho, que saiu voando. Dai o menino resolveu que
seu passarinho não poderia ficar sozinho no mundo e da mesma forma ele criou a
D. Joaninha de Barro e que o casal de pássaros saiu feliz e se multiplicando
pelo mundo de Deus.
Outra história que ela
nos contava, talvez porque fomos criadas em uma fazenda, ela aproveitava o
ambiente como ilustração para nos educar.
Tínhamos pavor dos
bem-te-vis porque ela dizia que eles eram os pássaros do “capeta” e era
considerado um dedo duro. Ela dizia que o bem-te-vi foi quem contou para os
soldados onde estava Maria e José quando eles fugiam com o menino Jesus e que
somente não tinham sido descobertos pelos soldados porque o João-de-barro os
havia escondido em sua casinha de barro.
Esta era a maneira um
tanto pueril que nossa mãe encontrou de nos falar de traição.
Mas agora eu ali
olhando aquele bem-te-vi, comecei a rir do nosso pavor infantil.
Moro numa rua chamada
Rouxinol, aliás, todas as ruas do bairro trás o nome de um pássaro. E acredito
que isto tenha uma razão de ser. Aqui todos os anos recebemos a visita de
milhares de andorinhas que migram do Canadá para o Brasil fugindo do inverno
rigoroso da América do Norte. Elas vêm em milhares, cruzam o céu batendo
freneticamente suas asas delicadas, num barulho quase assustador... Aninham-se
nas copas das árvores da rua. O barulho que fazem é enorme e a sujeira também.
Quando amanhece o dia, embaixo das árvores, fica uma lama de fezes e isto leva
alguns vizinhos a tomarem medidas nada corretas, chegam ao cúmulo de cortar a
copa das árvores deixando apenas os troncos. Outros soltam fogos, outros ainda
batem tampas de panelas, na esperança de espantá-las dali... Tudo em vão.
Esses adultos zangados
se esquecem de suas infâncias, não se lembram das falas dos mais velhos que
diziam que as andorinhas foram criadas por Deus para alegrar Maria e também
para brincar com menino Jesus.
Lucinda Prado