20/10/2011



Frequentando Drummond- Versos Presos (Lucinda prado)

Certos versos ficam presos
Adormecidos num recanto da alma.

Sei a senha, não sei decodificá-la.
Senha das palavras, livros da vida.

Talvez os tenha esquecido
Nas páginas de um livro fechado.

Se os procuro incessante
Há de achar-me o desânimo.

Hei de procurá-los no mundo
Quem sabe adormecidos na sombra
De um volume da vida, raro.

Senhas da existência
Senhas do mundo

Decifrá-las será desencantar
Meus versos contidos.

Certos versos ficam presos
Num recanto da alma.

Se os procuro incessante
Minha procura será meus versos.


Uma referência ao poema de Carlos Drummond de Andrade - A Palavra mágica

10/10/2011

O Palhaço - Lucinda Prado e Ana Paula Fumian

Me despi de mim

Pra vestir de você

Das suas cores e risos

Fiz a alegria das multidões

Que seguia o palhaço

Na suas alegrias e piruetas

Mas o que não sabiam

era o que rosto do palhaço

Não refletia ... seu coração.



Seu coração

Era terra sem dono

Cheirava abandono

E não tinha sementes

Pra nascer

Não tinha um nariz

De plástico

Era coração de palhaço

Mas sua arte era sofrer



Me despi de mim

Pra vestir as cores

Que te dei da aquarela

Eu quis colorir

Seus vazios

E a falta da cor

Do seu coração frio

De um palhaço infeliz

Que levava a alegria

Mas ainda não sabia

Encenar o amor


By Ana Fumian e Lucinda Prado

Foto: Lucinda Prado em vestes de palhaço

06/10/2011

MARIA, A DOIDA - Lucinda Prado

Quem foi que te disse que aqui tem pouso
Vai-te daqui com seus molambos encardidos
Quem sabe seu Benedito se apieda de ti
Te empresta o paiol para uma noite dormir.

Maria se vai com seus teres em trouxa
Gingando seu corpo, gordo, sujo, imundo!
Cai aqui, se levanta pra cair, mais suja ficou!
Olhos de rosto que o tempo deu um tapa, coitada.

Mãe, pai ninguém sabe quem são, que importa?
Diz nascida de uma noite de tormenta, agonia.
Não teve amor, logo não sabe do que se aventa
Coitada da Maria, tão gorda, tão suja, tão só.

Janelas e portas se fecham quando aponta Maria,
Menino corre pra dentro que lá vem Maria
Maria da Glória, do Carmo, de Fátima?
Quem é Maria? Ninguém sabe não.

Seu Benedito não acolhe pra noite de chuva
Maria de não sei de quê, só sabem que é louca, doída?
A chuva engrossa, o céu desmorona, trovão,
Na cabeça de Maria a trouxa se rompe, estrondos.

Coitada da Maria carrega dolente... Expia,
Pesadamente a saga de suas Marias...
A visão se turva ,o corpo fraqueja ,geme
Seu cão late sentido, dorido, urgente.

Na beira da estrada por chuva lavada, cavada
Encontram Maria amontoada na vala
Vala da vida, seu leito de morte
Morre Maria! Coitada, sozinha!
Quem foi que morreu?
Ninguém não... Foi apenas Maria,
Maria? Maria? O que é Maria?


Foto: google -

02/10/2011

Diálogo Poético de Além-mar - Lucinda Prado


“Sou todo teu, vida minha!”
Repliquei entre doces afagos de amor:
“Não quero todo, apenas as melhores partes.”
Respondeu-me com afável olhar de malícias:
“Para que precisas de meus ouvidos?”

“Para que ouças meus gemidos emaranhados
Em meus versos, docemente sussurrados,
No ressoar incerto de minha voz
Entre dentes... Puros cicios de amor

Para que sintas meu gritar de desejos
Em meus seios premidos contra teu peito
E nas batidas descompensadas de meu coração
Ouvirás meu gozo profundo, doce mistério sem fim.

Se encostar teus ouvidos em meus pulsos
Escutarás baixinho, meu chamado amigo
Para que te percas nas dimensões de risos
No ritmo e som do meu amor infindo

Ou quem sabe, quando de mãos dadas sairmos
Ouvindo Beethoven em sua Nona Sinfonia
Possamos junto ouvir o chamar dos céus
Nas notas musicais ternas de Für Elise."